A morte de Brigitte Bardot, aos 91 anos, reacendeu na França um amplo debate sobre como a sociedade deve recordar uma das artistas mais emblemáticas do século XX — ao mesmo tempo louvada por sua contribuição ao cinema e ao ativismo pelos direitos dos animais e criticada por suas posições políticas extremas nas últimas décadas de sua vida.
Bardot, que morreu em sua casa em Saint-Tropez, no sul da França, onde passou grande parte da vida e lutou em defesa dos animais, foi um dos maiores símbolos da cultura popular francesa, conhecida mundialmente por papéis marcantes em filmes como And God Created Woman (1956) e dezenas de outras produções europeias. Após abandonar a carreira cinematográfica em 1973, dedicou-se intensamente ao ativismo animal, fundando a Fundação Brigitte Bardot para proteção dos animais.
No entanto, seus últimos anos foram marcados por uma forte imersão em temas políticos, principalmente posições associadas à extrema direita francesa, incluindo críticas duras à imigração e ao Islã, além de comentários considerados racistas e homofóbicos em diversos momentos, que resultaram em múltiplas condenações por incitar ódio racial nos tribunais franceses.
Uma carreira que definiu uma era
Nascida em 1934, Bardot rapidamente se tornou um ícone global do cinema dos anos 1950 e 60, sendo frequentemente comparada — em termos de impacto cultural — a figuras como Marilyn Monroe. Com sua presença sedutora e naturalidade diante das câmeras, ajudou a redefinir a representação da mulher na tela e até a imagem francesa de sensualidade e liberdade. Filmes como La Vie Privée (1962) e Les Femmes (1969) consolidaram sua versatilidade como atriz e seu apelo internacional. Ao se retirar das telas, seu trabalho em defesa dos direitos dos animais a transformou em uma das vozes mais ouvidas no ativismo — embora isso também tenha alimentado críticas por vezes ferozes.
Legado político controvertido e disputa por tributos
A morte de Bardot não unificou opiniões na França. Líderes da direita e da extrema direita pedem homenagens nacionais e destacam suas contribuições culturais e filantrópicas, com alguns parlamentares lançando petições por um tributo oficial que celebrem sua vida e impacto. O presidente Emmanuel Macron a homenageou como “uma lenda do século”, ressaltando tanto seu brilho artístico quanto sua paixão pelos animais.
Por outro lado, figuras da esquerda questionam a ideia de tributos oficiais glorificando alguém cujas posições nos últimos anos foram profundamente divisivas, apontando que o reconhecimento público deve levar em conta também o contexto de suas declarações e ligações políticas controversas. Essa polarização se reflete inclusive em debates nas redes sociais e na cultura pop: recentemente, a cantora Chappell Roan apagou uma homenagem a Bardot após reação crítica de fãs, justamente por causa da associação da estrela com visões consideradas extremistas.
O fechamento de um capítulo complexo
Com seu funeral privado marcado para 7 de janeiro de 2026 em Saint-Tropez, seguido de um tributo público na cidade que ajudou a tornar mundialmente famosa, o nome de Bardot volta a provocar questões sobre como sociedades lembram figuras históricas de legado ambíguo — celebrando conquistas artísticas e ativismo social, mas sem ignorar posicionamentos prejudiciais ou discriminatórios.
A vida de Brigitte Bardot permanecia, até seus últimos dias, uma síntese das contradições do século XX: glamour e beleza, compaixão e controvérsia, arte e política — um legado que agora a França ainda tenta decifrar.